-
Cinema
Notícias
15 Años Piriápolis de Película
08/09/2018
Concentrado em um final de semana, entre 10 e 12 de agosto de 2018, o festival de cinema de Piriápolis, em 15ª edição, demonstrou energia e entusiasmo. Convidada a integrar o júri da seleção de curtas-metragens iberoamericanos, ao lado do cineasta e professor Bebe Kamin e do jornalista e crítico Fernando Brenner, conheci o evento que impulsiona o tradicional balneário uruguaio. Dos 30 curtas em competição, chama atenção a produção audiovisual do Uruguai, com seis títulos realizados por jovens egressos das escolas de cinema. Montevideo Soul, de Fabian Rojas e Mercedes Cosco ganhou o prêmio por compor, na forma de pequenas narrativas, uma espécie de mosaico das relações sociais. Dentre uma variedade de títulos, incluindo animação, dramas e documentários, decidiu-se por um prêmio ex aequo, por mérito equivalente, para a produção cubana Sucedió en el Cielo, de Oldren Romero e o filme brasileiro O Vestido de Myriam, de Lucas Rossi. Em comum, apresentam com coragem aspectos da existência vivida em limites dramáticos.
Da intensa programação de curtas, longas, homenagens e mostras especiais, dois documentários revelaram personagens fascinantes. No Viajaré Escondida, coprodução entre Argentina e Uruguai, de Pablo Zubizarreta, conta a história insólita de Blanca Luz Brum. Nascida 1905, na pequena comunidade de Pan de Azúcar, em Maldonado, a inquieta poetisa, autora de artigos, libertária e polemista, engajou-se em acontecimentos marcantes do século XX no continente. Discípula do filósofo peruano José Carlos Mariátegui, do qual teve um filho, foi também musa e amante do muralista David Alfaro Siqueiros, período em que engajou-se no movimento revolucionário no México. Convertida em símbolo da emancipação feminina, esteve próxima de Perón na Argentina e de Pinochet no Chile, suscitando controvérsias. A trajetória de Blanca, até a sua morte em 1985, é reconstituída num documentário envolvente através de depoimentos e parcos documentos. Isso porque a casa em que havia vivido, na ilha Robinson Crusoé, no Pacífico Sul, foi destruída por um tufão às vésperas do início do filme que torna-se, em decorrência, uma narrativa pela busca dos vestígios de Blanca.
Ao contrário, Soy lo que Quise Ser: Historia de un Joven de 90 é tomado pela personalidade forte de José Martínez Suárez, ao ponto das diretoras Mariana Scarone e Bertina Casanova assumirem que o filme não é “sobre”, mas “com” o cineasta que integrou a geração dos sessenta na Argentina. Nascido em 1925, com prodigiosa memória aos 90 anos, encantador em suas narrativas bem humoradas e inteligentes, Martínez Suárez domina a cena e, acostumado ao comando nos sets de filmagem, toma para si o controle do filme. É uma “instituição nacional” argentina do cinema e da música, roteirista, produtor e realizador de filmes que não tiveram a projeção internacional de diretores como Fernando Birri e Fernando Solanas, da mesma geração. Por mais de uma década foi diretor do Festival de Mar del Plata, inaugurado em 1954. Elegante e culto, Martínez Suárez atrai o olhar de Mariana e Bertina e conduz a câmera pelos documentos e testemunhos que refazem sua trajetória dedicada ao cinema como um modo de vida.
Realizado no imponente Argentino Hotel, num final de semana chuvoso e inóspito para passeios pela rambla em frente ao mar, o 15º Piriápolis de Película aqueceu pelo convívio entusiasmado de pessoas que fazem e trabalham pelo cinema, especialmente Jorge Jellinek e Gustavo Iribarne que a cada ano renovam esforços para realizar o evento uruguaio dedicado ao cinema latino-americano.